ONGD A Esperança (1994-2024). Família Agostiniana Recoleta.

[Parte 1] A ONGD La Esperanza faz parte da história solidária da Família Agostiniana Recoleta e de Navarra. Após o último bazar e a venda de seus bens, sua missão se encerra definitivamente. Nesta homenagem, elas relatam sua missão, sua fé e sua história.

Como tudo começou?

A origem de tudo isso é algo que permanece gravado em nossa memória, como se fosse ontem, e pode ser contada nos mínimos detalhes. Ela se deu graças a Mari Carmen Lizaso, mais conhecida entre todos nós como Mamen, e à sua amizade com o religioso recoleto frei Joaquim Pertíñez.

Joaquim era uma pessoa de grande habilidade com trabalhos manuais e, por isso, participava de cursos na Casa de Cultura de Lodosa, onde aprendia a trabalhar com argila. Foi nesse ambiente que ele conheceu Mamen, e uma forte amizade nasceu entre eles. Foi também ali que Joaquim compartilhou com Mamen sua alegria ao saber que seria designado para a Missão de Lábrea, no Amazonas, Brasil.

Mamen era muito amiga de Corpus, e passavam muito tempo juntas, especialmente quando estavam esperando seus respectivos filhos, o quarto de Mamen e o primeiro de Corpus. Mamen leu para Corpus o que Joaquim havia escrito em uma carta sobre a situação das crianças naquela distante região da Amazônia brasileira. Elas queriam ajudar, mas não tinham recursos sobrando. Enviaram uma pequena ajuda, mas sentiam que era insuficiente, até que Deus acendeu uma luz no coração e na mente de Corpus.

Em suas palavras: “Não tínhamos quase nada para oferecer! Mas, ao olhar ao nosso redor, para nossas casas, percebemos que em todas havia toalhas de mesa e muitas coisas sem uso. Quanta coisa a mais temos! E se organizássemos um bazar missionário com coisas que não usamos e que ainda estão em bom estado?”

A ideia foi acolhida com entusiasmo pelos membros da Paróquia de São Miguel de Lodosa, atendida pelos religiosos agostinianos recoletos, Plácido Rodrigo e Santiago García. Com isso, começaram a coletar materiais, que foram armazenados na casa paroquial, que estava vazia, pois os padres viviam no Colégio São José.

Para que o evento tivesse sucesso, fizeram muita divulgação e, no dia 19 de março de 1994, dia de São José, realizaram o primeiro bazar solidário. O segundo bazar foi realizado quase um mês depois, no dia 10 de abril, aproveitando o Domingo de Ramos, na Paróquia de Santa Maria de Sesma, onde outro recoleto, Francisco Piérola, era pároco.

“A expectativa inicial era arrecadar cerca de 50 000 pesetas (aproximadamente 300 euros), sendo que as mais otimistas chegavam a prever até 100 000 pesetas (600 euros). No entanto, entre os dois bazares, a quantia arrecadada foi de 1 017 000 pesetas (equivalente a 6 112,29 euros). Esse valor, para todos os envolvidos, parecia um verdadeiro milagre, como se tivessem escalado o Everest. Com essa ajuda, Joaquim conseguiu construir em Lábrea o primeiro Centro Esperança, que atendia 12 crianças”.

https://www.youtube.com/watch?v=NZHIjqjYVb8

Entretanto, tudo isso resultou em uma ONGD completamente regularizada, conforme as exigências legais. Como foi esse processo?

O que começou como uma iniciativa local de solidariedade foi ganhando proporções inesperadas. O processo se deu de forma gradual, sempre impulsionado pelas cartas e fotos que continuavam a chegar, mostrando as realizações concretas do dinheiro enviado. Contudo, nunca foi suficiente para resolver todos os problemas. Ele escrevia:

“Deixam as crianças na porta, raquíticas, desnutridas… Precisamos ajudá-las!”.

Essas palavras tocavam profundamente os corações das mães envolvidas, que, sem planejar, viram suas ações se multiplicarem por obra e graça do Espírito Santo. A cada passo, encontravam pessoas dispostas a ajudar, que pareciam ser enviadas por Deus.

Após os primeiros bazares, percebendo que a iniciativa havia chegado para ficar, Plácido nos cedeu algumas salas da Paróquia, onde montamos oficinas de pintura e costura. Na época, estava na moda usar gesso, e tivemos a ideia de fazer presépios. Fomos a Cintruénigo (a 55 km de lodosa) buscar ajuda, pois lá são especialistas em gesso.

Durante uma conversa com a missionária leiga paulina Amaya, ela nos lançou um desafio:

— Por que vocês não criam uma ONG?

Nossa resposta inicial foi:

— O que é isso?

Buscamos informações de forma autodidata, compreendendo as vantagens do processo, e redigimos várias versões dos Estatutos. No entanto, foi necessário criar quatro versões até que conseguimos a aprovação das autoridades. Estávamos prestes a desistir, decidindo voltar a fazer as coisas como antes, quando, no dia 5 de dezembro, dia da Recoleção Agostiniana, fomos a Marcilla para celebrar.

Foi lá que conhecemos o agostiniano recoleto Pablo Panedas, que demonstrou grande interesse pelo nosso trabalho e se ofereceu para nos ajudar com a redação dos Estatutos. Após algumas viagens de inverno, enfrentando neblina e gelo, conseguimos finalmente o selo de aprovação. A emoção e a alegria foram indescritíveis!

Desde outubro de 1996, éramos oficialmente uma Organização Não Governamental, o que nos permitia solicitar subsídios públicos de orçamentos destinados ao desenvolvimento.

Durante esse período, o agostiniano recoleto Jesus Vera nos ajudava com o transporte de materiais para os bazares. Jesus Mari Garrasa, então prefeito da cidade de Lodosa, apresentou nossa ONG a Maria Gurpegui, técnica da Oficina de Turismo e Desenvolvimento Local, que nos apoiou com a burocracia. Nossa força era a motivação, o entusiasmo e a capacidade de convencer as pessoas a nos ajudarem… e não os papéis.

Quando houve a mudança na prefeitura, essas questões técnicas e burocráticas foram transferidas para a Comissão de Missões e Desenvolvimento Social da Província de São Nicolau de Tolentino dos Agostinianos Recoletos, que disponibilizou para nós a técnica Inês Parrondo.

Inês, com sua dedicação e lealdade, conseguiu abrir três delegações adicionais da ONG (Pamplona, Madri e Chiclana de la Frontera, Cádiz), ampliando as possibilidades de obter subsídios em diferentes áreas geográficas e de diferentes administrações.

Com essas colaborações, realizamos muitas coisas. No entanto, o desafio não era tanto apresentar projetos, mas justificar os gastos conforme os padrões locais, enfrentando as dificuldades de comunicação e documentação da realidade de lá.

Chegou também o momento de sermos mais independentes: os Agostinianos Recoletos deixaram de atender à Paróquia de Lodosa, e tivemos que devolver as salas paroquiais, pois as necessitavam. Com a convicção de que esta era uma obra de Deus e de nosso pai Santo Agostinho, e sem recursos próprios (já que tudo era enviado para as missões), conseguimos comprar um local e uma van, pois a que os Recoletos haviam nos emprestado já não atendia mais às necessidades. Assim, seguimos em frente, porque é obra de Deus.

O próximo passo foi envolver nossas famílias e amigos. Um sobrinho, que gerenciava uma empresa de conservas de qualidade, teve a oportunidade de visitar algumas das missões e projetos concretos que apoiávamos no Brasil e em Serra Leoa. Ele se envolveu profundamente: doava todos os anos para os bazares 2 000 potes de conservas. A empresa fornecia os produtos, as máquinas e o trabalho, mas ele também não hesitava em pedir a colaboração de seus fornecedores.

Os Mercadinhos foram o vosso símbolo mais reconhecível. Foram muitos?

Na verdade, já perdemos a conta de quantos mercadinhos realizamos: são incontáveis. Percorremos as províncias de Navarra, Saragoça, Madri… Em alguns anos, chegamos a realizar uma média de seis, dependendo das oportunidades que surgiam. O resultado? Mais de dois milhões de euros destinados a quem mais precisava. Tudo o que foi alcançado com esse dinheiro foi extremamente importante, maravilhoso.

Além do dinheiro arrecadado nos mercadinhos, enviamos muitos bens de primeira necessidade para as áreas de missão, especialmente para Serra Leoa; e isso continuou até bem recentemente. No ano passado, por meio de alguns médicos, conseguimos enviar para as Irmãs Clarissas de Lunsar (Serra Leoa) 40 caixas de alimentos e máquinas de costura.

O último mercadinho (bazar) aconteceu em Madri, na cúria da Província de São Nicolau de Tolentino. Mesmo com algumas de nós adoecidas, até com bronquite, foi a nossa despedida. Conseguimos arrecadar pouco mais de mil euros e deixamos os últimos materiais para uma ONG irmã, a AyudaFortaleza, além de conservas para o Mosteiro de Santa Isabel, das Agostinianas Recoletas Contemplativas.

Em Lodosa, nos despedimos com dois mercadinhos: um nas festas de agosto, no dia 4, e outro no dia 5 de outubro, durante a Festa do Pimentão. Entre ambos, arrecadamos 2500€ para a Índia, destinados à missão onde trabalha o salesiano lodosano Alfredo Marzo, de mais de 90 anos de idade e 70 anos de serviço no local, mais um reflexo constante de nosso compromisso.

O material restante foi doado ao grupo de Ajuda a Lábrea, em Getafe. O toque final foi a venda da van e da sede. Os 5000€ obtidos com a venda da van foram enviados ao Lar Santa Mônica, em Fortaleza; e, por decisão e desejo de todas, o valor obtido com a venda da sede será destinado a quem iniciou tudo: Joaquim Pertíñez, hoje bispo de Rio Branco, Acre, Brasil, e aos Centros Esperança na Amazônia.