HIstoria de la Provincia de San Nicolás de Tolentino de la Orden de Agustinos.
1. A Província
Durante várias décadas os recoletos das Filipinas dependeram da única Província que incluía toda a Recoleção Agostiniana.
Algumas vezes eles mesmos escolhiam seus superiores; outras vezes, eram impostos a eles desde a Espanha. A distância e um modo de vida muito diferente não demoraria muito para mostrar a conveniência de uma maior autonomia.
Uma primeira tentativa foi feita em 1610, mas o autogoverno de fato não se tornou realidade até 5 de junho de 1621, quando o Papa Gregório XV elevou a Recoleção à categoria de Congregação, com o poder de se dividir em Províncias.
Foi convocado imediatamente um Capítulo Geral, que se reuniu em Madri de 19 a 30 de novembro. Foi eleito um Vigário Geral e, em 23 de novembro, a recente Congregação foi dividida em quatro Províncias, uma delas reuniria todos os religiosos e ministérios das Filipinas.
As notícias demoraram a chegar ao Extremo Oriente. Seu próprio Capítulo não foi celebrado até o início de fevereiro de 1624, quando a Província foi constituída e colocada sob o patrocínio de São Nicolau de Tolentino. O segundo Capítulo Provincial foi realizado em maio de 1626; todos os outros foram realizados regularmente a cada três anos.
Por mais de três séculos, a Província de São Nicolau haveria de ser uma província especial na Ordem. Enquanto em todas as outras províncias prevaleceu o aspecto conventual e contemplativo, na de São Nicolau sempre reinou o espírito missionário e apostólico.
No decorrer da história, as missões filipinas contribuíram para delinear e aperfeiçoar o carisma da Ordem, tornando-o mais conforme o modelo de Santo Agostinho, que não queria que seus monges permanecessem ensimesmados, mas sim abertos às necessidades da Igreja. Elas também fortaleceram sua unidade, já que o trabalho missionário era realizado por religiosos que vinham em sua maioria como voluntários das três províncias espanholas; e, finalmente, elas estabeleceram o padrão que todo apostolado recoleto deve seguir, combinando admiravelmente sua tarefa missionária com a vida interior e comunitária.
Entretanto, as circunstâncias às vezes mantêm as comunidades muito distantes da vida da Congregação. As diretrizes da Congregação chegavam tarde demais às Filipinas e seus religiosos não participavam do governo geral, nem dos Capítulos da Congregação. Enquanto os missionários mantiveram seu fervor primitivo, a falta de comunicação não gerou efeitos particularmente negativos, mas, à medida que se enfraqueceu, foi levando à indisciplina e o desgaste da identidade religiosa de muitos deles.
2. Expansão para o Sul
Entre 1622 e 1623, a Província expandiu consideravelmente seus horizontes missionários. Os reforços da Espanha em 1618 e as vocações do noviciado de Manila tornaram possível a abertura de novos campos de trabalho.
A) Mindanao
Em 6 de fevereiro de 1624, o Governador-geral, a mais alta autoridade das Filipinas, dividiu a imensa ilha de Mindanao em duas grandes partes. As regiões do nordeste foram entregues aos recoletos, o restante aos jesuítas.
Da mesma forma que aconteceu em outros lugares, os primeiros missionários desta região eram itinerantes: viajavam pelas praias, rios e pântanos em busca de nativos espalhados pelas regiões interioranas; em seguida, fundavam vilarejos onde construíam uma simples capela de madeira e palha, bem como uma cabana que servia de convento; ao redor da cabana se instalavam os poucos índios que estavam dispostos a deixar seus lugares de origem. Normalmente, era somente após este tempo que eles administravam o sacramento do batismo.
As crianças e as autoridades tinham um lugar especial em sua agenda diária. As crianças eram atraídas principalmente por meio da catequese, da escola e do canto. A catequese se baseava na repetição de certas orações e nas verdades fundamentais do cristianismo.
Apreciavam a suntuosidade do culto, especialmente durante a Semana Santa, Corpus Christi e os dias de festa dos santos padroeiros de cada povoado. As procissões, o canto da Paixão e do Terço, os autos de fé e a ação de algumas confrarias completavam sua eficácia.
A vida sacramental era bastante lânguida. O número de missionários raramente ultrapassava dez religiosos, e esta escassez, com a vastidão dos territórios, tornava a administração regular dos sacramentos praticamente impossível. No entanto, não faltavam algumas poucas almas escolhidas que eram particularmente devotas: muitas vezes eram chamadas beatas.
O trabalho do missionário não era fácil. A região ainda não estava pacificada, e os habitantes desconfiavam de todos os espanhóis: não era fácil para eles distinguir entre missionários e soldados e encomendeiros.
Os religiosos também tiveram que enfrentar obstáculos psicológicos e culturais, tais como a poligamia dos caciques, a posse de escravos e o apego a seus próprios ritos e tradições religiosas.
Não deve ser surpresa que esta primeira fase de evangelização, que tinha sido sem incidentes, tenha sido abruptamente interrompida pela revolta dos indígenas em julho de 1631. Em poucos dias eles saquearam as aldeias, incendiaram os conventos, profanaram os vasos sagrados, assassinaram quatro missionários e prenderam outros dois.
Revoltas como estas certamente dificultaram o trabalho missionário, mas não o paralisaram; ao contrário, foi surpreendente a rapidez com que restauraram as missões que haviam sido devastadas durante a rebelião, bem como a rápida reconstrução das igrejas e conventos incendiados. A reconstrução do tecido social e religioso seria mais trabalhosa.
B) Palauã
Quanto a Palauã e ao arquipélago de Calamianes que está situado mais ao norte, temos registrado que os primeiros quatro missionários desembarcaram em Cuyo em 1623, e de lá se espalharam para Agutaya, Dumaran, Linapacan e para o norte da maior ilha, Palauã.
Toda essa área se tornou um alvo favorito para as invasões mouras. O ataque mais sangrento ocorreu em 1636, quando os piratas invadiram Cuyo e Agutaya, queimaram as aldeias, assassinaram crianças e idosos, e levaram cativos tantos quantos julgavam capazes de trabalhar. Entre eles estavam três missionários: João de São Nicolau, Alonso de Santo Agostinho e Francisco de Jesus Maria. Todos os três morreram nas mãos dos invasores. Eles foram os primeiros de uma trágica e sangrenta série de acontecimentos que se estenderam até o século XIX.
Essas constantes adversidades abalaram a Província e a estimularam a buscar meios para aumentar a segurança de seus filhos. Infelizmente, suas reivindicações ao governo de Manila não tiveram o efeito desejado, e as soluções que ele foi capaz de fornecer foram insuficientes. Em 1659 a província foi forçada a renunciar aos ministérios de Cuyo e Calamianes.
C) Romblon, Mindoro y Masbate
A administração destas ilhas, agora mais próximas de Manila, foi assumida pelos recoletos, obrigados pelo governo e pela necessidade de estabelecer uma base de apoio em uma área mais segura.
Em Romblon, a figura chave era Agostinho de São Pedro, que viveu na região entre 1644 e 1650. Sua reconhecida experiência na arte da guerra lhe rendeu o apelido de Padre Capitão, e as fortificações militares que ali ergueu puseram um fim às invasões mouriscas.
Quanto a Mindoro, as 4.000 famílias cristãs que os recoletos encontraram ao chegar em 1679 já haviam se multiplicado em 1692 até alcançar a cifra de 12.000 no ano de 1716.
Tornaram-se encarregados das ilhas de Masbate, Burias e Tablas em 1687. Naquela época, a população estava em um estado de total negligência. Eles tiveram que começar quase do zero, percorrendo as montanhas e agrupando as pessoas dispersas. Em 1691, já tinham reduzido a população dispersa em 60 famílias, e em 1720, eram 525.
3. Japão
A partir de 1602 a Igreja filipina estava totalmente comprometida com a evangelização do Japão, onde uma gloriosa e sangrenta página de heroísmo missionário estava sendo escrita.
Os agostinianos recoletos, pobres em recursos materiais e humanos, não puderam a princípio associar-se a um empreendimento tão glorioso, mas seguiram seu desenvolvimento com uma concorrência santa.
Entretanto, em julho de 1622, um grande grupo de 24 religiosos chegou a Manila, o que lhes permitiu juntar-se a eles com entusiasmo. Entre 1623 e 1632, eles organizaram seis expedições ao Japão, embora infelizmente apenas duas delas tenham chegado ao seu destino.
A primeira expedição era composta por Francisco de Jesus e Vicente de Santo Antônio, um espanhol e um português, respectivamente. Durante seis anos, ambos realizaram intensa atividade missionária em meio a uma perseguição impiedosa até novembro de 1629, quando foram capturados e encarcerados.
Eles passaram três anos na prisão de Omura esperando pelo martírio. Os dois foram queimados vivos em Nagasaki em 3 de setembro de 1632, após terem sofrido várias vezes a tortura das águas sulfurosas no Monte Unzen. Ambos foram beatificados por Pio IX em 1867.
Juntaram-se a eles três mártires japoneses: Mâncio Ichizaemon, Lourenço Hachizo e Pedro Kuhyoe. Eram colaboradores dos missionários como catequistas e os três haviam professado como agostinianos recoletos na prisão de Nagasaki. Foram decapitados em Nagasaki em 28 de outubro de 1630.
Eles não são os únicos mártires japoneses. Vicente nos dá os nomes dos 67 confrades e terciários martirizados em 28 de setembro de 1630; e antes disso, Francisco estimou em 300 o número de confrades que haviam sofrido o martírio.
A segunda expedição que conseguiu chegar ao Japão partiu de Manila em agosto de 1632, era formada por 11 religiosos, pertencentes a cinco ordens diferentes. Eram recoletos Melchior de Santo Agostinho e Martim de São Nicolau.
A estadia deles em solo japonês deveria ser muito breve, ao serem traídos pelos marinheiros chineses que os havia conduzido, foram capturados em Nagasaki em 2 de novembro e queimados até a morte 40 dias depois. São João Paulo II os beatificou em 23 de abril de 1989.
Finalmente, este glorioso capítulo da Província de São Nicolau no Japão é encerrado por Santa Madalena de Nagasaki, que morreu torturada em meados de outubro de 1634. Ela era uma terciária da Ordem e, após vários meses de acompanhamento e incentivo aos cristãos espalhados pelas montanhas, ela se apresentou voluntariamente ao perseguidor.
A Província permaneceu interessada pela evangelização do Japão durante alguns anos, mas não conseguiu retornar ao país.
Nada nos impeça de realizar tão heroico empreendimento!
“Que ninguém tenha medo dos trabalhos e perseguições que se suportam nesta vinha; pois, em comparação com os dons e consolos que sua divina Majestade comunica, todos eles são agradáveis e suportáveis… eis, meus queridos padres e irmãos: apressemos com o respeito da carne e do sangue, e que nada nos impeça de realizar tão heroico empreendimento. Gostaria de convencer cada um em particular, com lágrimas que brotam do fundo do meu coração; pois sei o quanto é bom que haja ministros do santo Evangelho nesta terra, em vista dos grandes frutos que são produzidos; e o quanto são gloriosos para nosso Senhor, os trabalhos e as perseguições que os religiosos sofrem”.
Beato Francisco de Jesús,
Carta ao prior provincial André do Espírito Santo,
26 de março de 1627.
Façanha japonesa
Francisco de Jesus era espanhol. Professou como agostiniano recoleto em Valladolid em 1615. Após sua ordenação sacerdotal, foi designado para estudar em Salamanca, mas se ofereceu para ir às Filipinas. Com 17 companheiros embarcou na quarta missão às ilhas em 1619 e chegou em agosto do ano seguinte. Permaneceu por menos de três anos, principalmente em Zambales. De lá, foi convocado à Manila em 1622 para liderar a primeira missão ao Japão.
Vicente de Santo Antônio, na época com a mesma idade de Francisco, nasceu em Albufeira, Portugal. Cresceu em Lisboa e foi ordenado sacerdote na mesma cidade em 1617. Em 1619 já estava nas Ilhas Canárias, de onde decide ir para o México. Durante a viagem, sua vida foi ameaçada por uma tempestade, que o levou a fazer um voto a Deus para entrar na vida religiosa. No México, conheceu os recoletos da quinta missão filipina e pediu insistentemente o hábito.
Foi aceito à expedição e fez seu noviciado no galeão. Em Intramuros de Manila, professou em 22 de setembro de 1622. Como recém-professo, não se arriscou pedir para ser enviado ao Japão, mas foi nomeado para acompanhar Francisco de Jesus.
Após uma longa viagem repleta de perigos, viajaram disfarçados de comerciantes em uma embarcação chinesa que chegou ao Japão no dia 20 de junho de 1623.
A perseguição desencadeada contra os cristãos pelas autoridades japonesas era violenta, mas no dia 14 de outubro os dois recoletos já estavam em Nagasaki, a cidade dos mártires, o centro do cristianismo japonês.
Durante seis anos permaneceram escondidos durante o dia e exerciam o ministério durante à noite, sempre em perigo de serem traídos. Vicente passou mais tempo escondido em Nagasaki entre os compatriotas portugueses. A partir de 1626, Francisco mudou-se para o norte de Honshu, onde a perseguição não foi tão feroz. A partir de então, ficaram separados durante dois anos.
Em 1628, Francisco retornou a Nagasaki. A perseguição se intensificou e os dois missionários foram capturados em um intervalo de sete dias, Francisco foi o primeiro em 18 de novembro de 1629. Com eles, seus jovens catequistas japoneses foram capturados: dois de Vicente, Kaida Hachizo e Yukimoto Ichizaemon, mais Sawaguchi Kuhyoe, o catequista de Francisco.
No início, os cinco foram presos conjuntamente em Nagasaki. Os missionários aproveitaram este tempo para entregar o hábito a seus catequistas e testemunhar sua profissão como agostinianos recoletos: passaram a ser chamados: Lourenço de São Nicolau, Agostinho de Jesus Maria e Pedro da Mãe de Deus.
No dia 11 de dezembro Francisco, Vicente e outros missionários estrangeiros foram transferidos para a prisão de Omura. Durante quase dois anos os dois agostinianos recoletos, um agostiniano, um jesuíta e um franciscano se preparam para um martírio que acreditavam ser iminente. No início são acompanhados, em uma cela separada, por um grupo de 67 cristãos paroquianos. Eles foram sacrificados, alguns, na fogueira e outros decapitados, em 28 de setembro de 1630. Um mês depois, em Nagasaki, seus antigos catequistas, agora irmãos de hábito, também foram decapitados. Vicente e Francisco notificaram o provincial, com grande alegria.
Para os não japoneses, havia ainda mais provas, como os terríveis banhos nas águas sulfurosas de Unzen, em dezembro de 1631. Foram então deixados em Nagasaki, onde deveriam ser queimados vivos em 3 de setembro de 1632.
Os cinco recoletos — um espanhol, um português e três japoneses, símbolos da universalidade do carisma agostiniano recoleto — foram beatificados em 1867.
No dia seguinte, com as cinzas de seus irmãos ainda fumegantes, chegaram a Nagasaki os dois recoletos que conseguiram chegar ao Japão depois de muitas tentativas. Eram Melchor de Santo Agostinho, de Granada, e Martim de São Nicolau, de Saragoça. Ambos já estavam nas Filipinas há dez anos, onde eram bem conhecidos: Melchor como pregador e Martim como uma pessoa de grande experiência espiritual e extraordinária sensibilidade para com os doentes.
Em menos de três meses, no dia 1 de dezembro, foram capturados e, dez dias depois, martirizados. Eles foram beatificados por São João Paulo II em 1989.
Depois deles, apenas um recoleto conseguiu colocar os pés em solo japonês no porto de Osaka em 1635, João de Santo Antônio (†1663).
O cristianismo ficou sob a responsabilidade de alguns leigos como Madalena de Nagasaki, uma jovem mulher de família de mártires, uma terciária liderada por Vicente.
Madalena se dirigiu às montanhas e lá se dedicou a encorajar, confortar e educar os cristãos escondidos em cavernas e grutas. Vendo que havia muitos que estavam perecendo, decidiu se apresentar ao perseguidor.
Foi até Nagasaki, confrontou o governador, desmascarou suas mentiras, resistiu a suas seduções e se submeteu à tortura. Ela morreu no dia 15 de outubro de 1634, após 13 dias, pendurada de cabeça para baixo em um buraco.
Foi beatificada em 1981 e canonizada seis anos mais tarde. Desde 1989 é padroeira da Fraternidade Secular Agostiniana Recoleta.
Marcas da evangelização em Japón
A estadia dos Agostinianos Recoletos no Japão foi de curta duração, mas intensa. O tesouro das cartas dos missionários foi publicado em 2019 sob o título Letras de Fogo.
O Japão proibiu o cristianismo até 1873. Em 2015, a UNESCO listou os locais desta perseguição, como a Catedral de Urakami, construída no local onde os capturados foram interrogados, como Patrimônio Mundial. Em Suzuta, Omura, uma cruz marca o local da prisão onde os beatos recoletos Vicente e Francisco foram presos e depois executados no Monte Nishizaka, Nagasaki, onde há um museu e um monumento aos mártires.
No ano de 2019, Santiago Bellido (Valladolid, Espanha, 1970) pintou os três mártires recoletos, os beatos: Pedro, Agostinho e Lourenço. Ele usou uma perspectiva oriental, semelhante à nossa axonometria: as figuras não diminuem de tamanho com a distância.
A percepção tende a parecer aérea. Na pintura se mostra uma cidade distante ou na sobreposição das figuras, uma em cima da outra. São três grupos muito compactos, orgânicos, em um tom expressionista, quase irreal, bastante espiritual, separados por um contorno branco.
No centro estão os mártires: Pedro, totalmente concentrado e sereno; Agostinho, esperançoso; Lourenço, temeroso. Ao redor deles estão pessoas com doze diferentes atitudes: à direita, de frente para trás, estão o zombador, a orgulhosa, o informante, o soberbo, a furiosa e o jubiloso. O grupo tem como finalização uma máscara de Buda típica da região.
À esquerda, de frente para trás, o angustiado, a compadecida (com uma criança), o prudente (que acalma o vingador), o carrasco obediente (que demonstra sua preocupação, olhando severamente para o grupo à direita) e o ocidental (que reza enquanto olha para o Espírito, a um nível de compreensão da cena que só ocorre no grupo dos mártires). Finalmente, há um cão, um símbolo de fidelidade discreta, o único que busca a cumplicidade do espectador.
O Espírito Santo, na forma de uma chama, paira sobre os mártires e os envolve em luz. Esta brancura só é interrompida em dois pontos que permitem que os mártires entrem em contato com os verdugos: o “mau” verdugo traz o martírio; o verdugo “bom” recebe deles a semente da Fé.
A cor e a perspectiva permitem que o terreno apareça, na parte inferior, quase como o contorno de uma nuvem que envolve as figuras dos mártires.
Uma Província de voluntários
Até 1824, quando foi aberto o Colégio noviciado de Alfaro (La Rioja, Espanha), a Província de São Nicolau não tinha casas na Espanha, nem mesmo casas de formação. Quase todos os seus membros foram recrutados entre os religiosos dos 32 conventos espanhóis. Para este fim, um comissário foi enviado periodicamente das Filipinas para visitá-los em busca de voluntários.
Teoricamente, o Estado pagava por estas viagens, mas, na prática, sua contribuição foi reduzida para cerca da metade. A Província era responsável pelo resto. Na medida do possível, preferiam os religiosos que tinham concluído seus estudos, pois nas Filipinas não teriam a oportunidade de completar sua formação adequadamente.
O sistema teve sucesso — no século XVIII, 440 voluntários chegaram às Filipinas em 13 expedições — mas teve grandes inconvenientes: às vezes as dificuldades econômicas atrasavam o envio de comissários; outras vezes o escolhido não tinha bom desempenho; às vezes, finalmente, os voluntários mudavam de ideia antes de chegar às Filipinas; e assim houve uma escassez crônica de missionários.
O padre Capitão e sua Catedral
Se há um agostiniano recoleto que merece ser chamado lendário nas Filipinas, é Agostinho de São Pedro, Padre Capitão (1599-ca. 1660); e se há um líder muçulmano que também é considerado um mito, é Mohammad Dipatuan Kudarat, Sultão Kudarat — ou Corralad nas crônicas espanholas — que até mesmo deu seu nome a uma das províncias de Mindanao. Eles são os campeões dos dois lados opostos nesta grande ilha ao longo do século XVII: os mouros e os espanhóis.
A rigor, porém, o Padre Capitão não era espanhol, pois nasceu em Bragança, Portugal. Foi educado na Espanha: estudou em Salamanca e professou no convento recoleto de Valladolid (1619). Embarcou para as Filipinas sem ser sacerdote e foi ordenado no México, no meio da viagem. Com o Beato Martim de São Nicolau, fez parte da missão de 1622, que chegou a Manila no ano seguinte.
Foi enviado a Mindanau, uma ilha recém-confiada aos recoletos. Lá, sua primeira tarefa foi sobreviver aos ataques muçulmanos que assolaram as plantações, cometeram atrocidades e levaram homens e mulheres cativos. Frei Agostinho revela seu gênio militar, organiza o povo, instrui-o militarmente e constrói fortificações com ele.
Um bom exemplo que chegou até nós, está muito mais ao norte, na fortaleza da igreja de Romblon. No mapa, esta ilha fica longe dos muçulmanos do sul, mas eles frequentemente iam para lá. A primeira experiência dos recoletos prefigurou esta tendência geral: assim que tomaram posse, o primeiro pároco teve que fugir para as montanhas com a roupa do corpo para evitar ser capturado. Era 1635, apenas quatro anos após a fundação do povoado.
Padre Capitão foi o encarregado de organizar a defesa de Romblon entre 1644 e 1651. Ele construiu uma igreja bem sólida, com uma torre cuja parte inferior serviu de fortaleza; não a construiu em um lugar alto, mas no abrigo da montanha, reunindo toda a aldeia. Acrescentou duas fortificações no alto (na parte inferior, o forte de Santo André) e um muro com três fortalezas, que hoje já não existe, para fechar o acesso à praia.
Em 1974, a igreja (na parte superior) tornou-se a sede da nova diocese de Romblon, uma das mais antigas e inusitadas catedrais do país.
Almansa, o voluntário obstinado
“Sempre que pude, escrevi a Vossa Reverendíssima agradecendo a escolha que fez em minha pessoa, destinando-me à conversão do Reino do Japão… para qual Reino do Japão saí daqui duas vezes na companhia dos outros religiosos que esta Província de São Nicolau enviava…
A primeira vez que servimos ao Nosso Senhor, nós, os religiosos e as outras pessoas no navio, nadamos em direção à terra, esperando para nos cobrir com as roupas que o mar estava arremessando. Na segunda vez, há dois meses, o senhor Governador nos impediu de viajar, quando já estávamos a 50 léguas de Manila para embarcar… muito dinheiro foi gasto em ambas as viagens.
Peço humildemente a Vossa Reverendíssima, com toda a seriedade e pelo sangue de nosso Redentor Jesus, que por favor entregue esta carta ao nosso Padre Vigário Geral — que ainda não conhecemos — na qual lhe peço permissão para ir ao Japão, ajudando-me, como um pai tão bondoso, a obter tal permissão. Que a licença venha de tal forma que eu não possa ser impedido“.
Miguel de Santa María, ‘Almansa’,
ao vigário geral Jerônimo da Ressurreição.
Julho de 1630.
São Nicolau de Intramuros
Localizados na atual geografia da Província, espalhada por vários continentes, podemos distorcer a perspectiva histórica. Ainda mais quando o ponto focal desapareceu há três quartos de século. Estamos falando do convento de São Nicolau de Tolentino em Manila, a Casa Mãe da Província, durante 337 anos.
Quando chegaram à Manila, em 1606, os recoletos se estabeleceram fora das muralhas da cidade, em uma área chamada Bagumbayan. Mesmo antes de embarcar nos portos da Espanha, eles haviam escolhido São Nicolau de Tolentino como seu santo padroeiro e dedicado a ele seu novo convento.
Eles demonstraram sua devoção, pois em pouco mais de um ano os fiéis os convenceram a se mudarem para dentro das muralhas da cidade, ao lado da sede das instituições. Com as ofertas eles compraram um terreno ao lado dos muros.
Para construir o convento e a igreja (na parte superior) eles receberam o apoio de Bernardino Maldonado del Castillo, um grande devoto de São Nicolau. A construção foi concluída em 1619 por Rodrigo de São Miguel, que teve o prazer de dizer que foi uma das melhores obras da cidade.
Este novo convento deixou de ser chamado São Nicolau, Bagumbayan, para ser chamado São João Batista. Desde então, Intramuros foi a sede do governo da Província: primeiro as Filipinas, depois Japão, Espanha, China, Venezuela, Trinidad, Peru, Inglaterra…
Em Intramuros residia o Prior Provincial e seu Conselho. Aqui chegavam as missões desde a Espanha e eram mantidos os arquivos e biblioteca da Província, pois era também uma casa de formação, enfermaria geral e a casa de repouso.
Foi assim durante séculos, até a Segunda Guerra Mundial, em 3 de fevereiro de 1945, quando tropas americanas bombardearam Intramuros, onde tinham encurralado os japoneses. As bombas arrasaram a cidade e, com elas, o convento dos recoletos. Os japoneses tinham como alvo o povo. Entre os milhares de vítimas estavam mais de cem religiosos, incluindo seis recoletos (na parte inferior).
Hoje, da gloriosa história de São Nicolau Intramuros, resta apenas uma placa comemorativa onde outrora estava a soberba torre; e, no mapa da rua Manila, o nome da Rua Recoletos, que delimitava o convento.
SEGUINTE PÁGINA: 3. Século XVIII: Filipinas, uma terra de façanhas
ÍNDICE
História da Província de São Nicolau de Tolentino:
‘Sempre em missão’
- História da Província de São Nicolau de Tolentino: ‘Sempre em missão’
- 1. Introdução: “Navigare necesse est”
- 2. Século XVII: A Província de São Nicolau de Tolentino
- 3. Século XVIII: Filipinas, uma terra de façanhas
- 4. Século XIX: Filipinas, auge e declínio
- 5. Século XX antes do Vaticano II: a eclosão
- 6. Século XX depois do Vaticano II: agitação em alto mar
- 7. Século XXI: perspectiva de futuro
- 8. Epílogo: Viver o presente com paixão e abraçar o futuro com esperança